A Argentina sagrou-se tricampeã mundial neste último domingo(18), com uma equipe regida pelo gênio e maestro Lionel Messi em cima da França de Mbappé. Uma final inesquecível de tirar o fôlego, um 3x3 histórico, em que por alguns momentos a fatura poderia estar liquidada pela seleção argentina, porém a reação francesa foi surpreendente, levando a partida à prorrogação e disputa de pênaltis. Muitos são os aspectos que podem ser descritos e analisados sobre esta final, bem como sobre esta copa no Qatar. Mas particularmente, chama a atenção a bela campanha de Marrocos, primeira seleção do continente africano a disputar uma semifinal. Africana e muçulmana. Com um estilo de jogo inspirado no coletivo, a equipe marroquina surpreendeu e eliminou adversários tradicionais, entre eles Espanha e Portugal. Embora tenha perdido a disputa pelo terceiro lugar para a Croácia, a campanha logrou êxito com um inédito 4° lugar no torneio.
Em termos geopolíticos, uma copa do mundo pode ser encarada como um bom momento para compreender questões políticas delicadas e históricas; tirando o ranço ideológico de parte da intelectualidade "de esquerda" que só enxerga o futebol e demais esportes como "alienação", cabe aqui fazermos uma ou duas reflexões acerca desta copa: 1. A presença sul-global triunfante nas semifinais e o consequente título da sul-americana Argentina e 2. A multipolaridade dentro de campo como afirmação inegável de um caráter de superação histórica frente à supremacia europeia ocidental.
Não vamos aqui cair na tentação simplista identitária de atribuir o fator racial como principal atributo, como por exemplo a seleção francesa que terminou a final com dez jogadores negros em campo, com exceção do goleiro. A colonização francesa sobre o continente africano roubou riquezas, patrocinou golpes de estado, escravizou povos e ceifou milhares de vidas. A França ainda não pagou por este "preço", nem se sabe se algum dia irá pagar...se .a seleção francesa está recheada de afrodescendentes, a mesma coisa não se observa no governo daquele país. O iluminismo ainda é eurocêntrico.
Voltando à vaca fria, sobre os dois aspectos mencionados, ressaltemos que o primeiro aspecto( A presença sul-global triunfante nas semifinais e o consequente título da sul-americana Argentina), serve como metáfora ante a uma nova possível configuração de relações de forças políticas e econômicas. O BRICS, elevado a uma condição integradora de países subdesenvolvidos devido à condição de dependência econômica gerada pelas potências hegemônicas, se torna um fator crucial cada vez mais presente. Tomara que assim se afirme, até que não haja nenhuma sabotagem por parte de suas classes dominantes, sempre vendidas ao capital externo. E que também afirme a morte do imperialismo dos EUA em sua totalidade.
O outro aspecto(A multipolaridade dentro de campo como afirmação inegável de um caráter de superação histórica frente à supremacia europeia ocidental) tem a ver não só com a "diversidade" étnica, mas sim em termos de estabelecer uma igualdade de forças representadas pela independência e soberania dos países, respeitadas nos marcos desta nova ordem mundial. Ao passo que ao mesmo tempo, o futebol como parte integrante da indústria de entretenimento e capturado por sua lógica mercantil, sendo parte de uma sociedade do espetáculo, bem como centralizado na própria Europa e seus campeonatos de alto rendimento tanto futebolístico e financeiro, pode também sofrer um "abalo" diante desta nova configuração mundial; aí é uma questão de gestão de recursos, de profissionalização, de investimentos desde a base neste setor, para que deixemos aqui no velho terceiro mundo de sermos meros exportadores de matéria prima riquíssima, e possivelmente consigamos algum dia mantermos aqui, no Brasil por exemplo, nossos talentos jovens desfilando pelo maior tempo possível em nossos gramados e sua consequente identificação maior com seu povo e nação.
Para finalizar, muito aqui deste texto escrito sinaliza um desejo, um sonho; a LIBERTAÇÃO do jugo imperialista, de um poder supremo anti humano, baseada em relações de classe, impostas de cima pra baixo, com a falsa dicotomia vencedor/perdedor, a superação de um modelo ultrapassado, de exploração e deformador do caráter e da emancipação humana - que assim seja, e VIVAM OS POVOS OPRIMIDOS, CARAJO!